Luiz Gazzola (Almaviva)
March 28th, 2016, 01:36 PM
9089
A compania de ópera do Theatro São Pedro, em São Paulo, SP, está extremamente ativa, com uma programação mais diversificada e numerosa do que qualquer outra compania brasileira. Opera Lively esteve presente na récita semi-encenada da última ópera de Carlos Gomes, Condor, no domingo de Páscoa, 27 de março de 2016. A apresentação contou com figurinos, maquiagem, aderêços, luzes teatrais, e um piano, mas sem orquestra, côro, e cenários.
9069
Poster original da estréia no La Scala
Condor, opera em três atos cantada em italiano, estréia em 21 de fevereiro de 1891 no Teatro alla Scala em Milão, Itália
Música de Carlos Gomes (1836-1896)
Libreto de Mario Canti
9070
Carlos Gomes
Pianista Paulo Almeida
Direção Cênica Paulo Esper *
Elenco:
Eduardo Trindade, tenor, no papel título de Condor *, um renegado, chefe da Horda Negra
Marly Montoni, soprano, Odalea *, rainha de Samarcanda (antiga cidade persa, hoje no Uzbequistão)
Flávia Albano, soprano, Adin (trouser role) *, um pagem da rainha
Gustavo Lassen, baixo, Almazor, um astrólogo da corte e homem sábio
Andreia Souza, mezzo-soprano, Zuleida, uma nômade, mãe de Condor
(o sexto personagem, Il Mufti, um curto papel comprimário, não foi incluído)
9071
O elenco - da esquerda para a direita, Andreia, Marly, Eduardo, Flávia, e Gustavo - Foto Opera Lively
* Entrevistados por Opera Lively - veja as entrevistas clicando nos links abaixo:
Marly [aqui (http://operalively.com/forums/content.php/1045-Entrevista-Exclusiva-de-Opera-Lively-com-a-soprano-brasileira-Marly-Montoni)]
Flávia [aqui (http://operalively.com/forums/content.php/1046-Entrevista-Exclusiva-de-Opera-Lively-com-a-soprano-brasileira-Flavia-Albano)]
Eduardo [aqui (http://operalively.com/forums/content.php/1048-Breve-Entrevista-Com-o-Tenor-Brasileiro-Eduardo-Trindade)]
Paulo [aqui] (o link será ativado no futuro próximo - entrevista ainda não publicada)
Não percam também a entrevista com o maestro Luiz Fernando Malheiro, diretor artístico e principal regente do Theatro São Pedro e do Festival de Ópera do Amazonas, também já gravada mas ainda não transcrita e publicada.
--------------
A Ópera
Ato I - Por razões de preceitos religiosos, não se permite que Odalea, rainha da Samarcanda, conheça o amor por um homem. Após um prelúdio, Adin, um pagem da soberana, anuncia que alguém - o renegado Condor, chefe da Horda Negra de bandoleiros - violou a área sagrada do castelo real, ao tentar invadir esses aposentos para ver a beleza da rainha. Condor prontamente declara seu amor por Odalea, que se vê incapacitada de ordenar que o matem, para grande indignação da corte e de Almazor (um astrólogo e homem sábio).
Ato II - A rainha vai à mesquita para participar de ritos religiosos, mas sua comitiva é atacada por selvagens. Condor, recusando-se a ouvir os conselhos de sua mãe Zuleida (que está preocupada com sua obsessão por Odalea), salva a rainha do ataque. Odalea deseja encontrar seu salvador, e Zuleida lhe diz que Condor é o filho do sultão Amurath, portanto tem sangue nobre. A rainha, cada vez mais apaixonada por Condor, o nomeia como Emir. O povo, no entanto, não aceita a nomeação e se revolta.
Ato III - Após a bela peça instrumental "Notturno", Odalea está agitada e indecisa entre o dever e o amor. Almazor anuncia que a vida da rainha está ameaçada por causa de seu amor. Adin canta do amor de uma pomba por um gavião. Condor se oferece para sacrificar a própria vida para salvar Odalea. Um grande incêndio atinge a cidade. Condor se suicida com um punhal, para salvar a rainha. O povo invade o palácio e vê Odalea se debruçando sobre o cadáver se seu amado. Odalea joga o punhal ao chão, e grita "Agora, povo ingrato, rasguem meu coração também."
Números musicais e duração
Preludio - 5:08
Ato I – 25:51
Nel regno delle rose (Adin)
Dell'arme il segnal (Almazor, Odalea, Adin)
Aquila pellegrina che fendi... (voce lontana - Condor)
Dea celeste ideal (Odalea sola - indi Condor)
Ato II – 22:15
Già l'alba appar, fedeli, alla preghiera (popolo)
Orda crudel, feroce (monologo - Zuleida)
Orda selvaggia (popolo, il Mufti, Adin)
Vedi, commossa ell'è (assieme - indi Zuleida, Condor)
Ato III – 31:02
Notturno
Quanto silenzio a me... (Odalea sola - frase)
Avea sultana altera (serenata - Adin)
Ti vedo, ognor, in tua follia sublime (Odalea)
Le mie stele salutano in te (Adin, Zuleida, Condor, Almazor)
Fissami in volto, dimmi (Odalea, Condor)
Total – 84:16
Discografia
Há uma gravação da ópera feita ao vivo em 1986 no Theatro Municipal de São Paulo. O regente é o maestro Armando Belarditro, com a orquestra do teatro. Intérpretes: Renata Lucci (Odalea), Sérgio Albertini (Condor), Niza de Castro Tank (Adin), Tereza Boschetti (Zuleida), Benedito Silva (Almazor), e Jairo Vaz (il Mufti).
9076
Apesar dos vários ruídos e do som ruim, os cantores e a orquestra são bons, e recomendo essa gravação aos leitores que querem se familiarizar com a ópera. Os números musicais dessa gravação podem ser encontrados no YouTube, completos, em sequência autoplay. Eis aquí o primeiro número:
https://www.youtube.com/watch?v=9y9EMr8tWXE
-----------
Histórico da ópera e comentário musical
Condor foi a última ópera de Carlos Gomes e a penúltima obra de expressão do compositor, antes do poema vocal-sinfônico Colombo. Foi encomendada pelo Teatro alla Scala (a única vez que isso aconteceu na carreira de Gomes). Ele estava no Brasil para a apresentação de Lo Schiavo no Rio, já sofrendo os primeiros sintomas da doença que haveria de matá-lo, quando recebeu o convite do Scala. O teatro deu-lhe o libreto já pronto, sem que o compositor pudesse influenciar a escolha. O libretista Mario Canti é bastante obscuro.
A ópera é ambientada na antiga cidade de Samarcanda, conhecida como a Roma do Leste ou Pérola do Oriente, povoada por persas, e hoje localizada no Uzbequistão. O compositor estava no auge de sua maturidade musical, e o terceiro ato é um dos mais belos de sua carreira.
A ópera Condor é também conhecida como Odalea. Aparentemente Carlos Gomes trocou o nome porque pensava em levar a ópera à França, e na linguagem da época "con d'or" (cone de ouro) era a gíria que se referia à genitália feminina.
Após cinco meses compondo a peça, a estréia se deu no dia 21 de fevereiro de 1891, com um elenco de primeira: Giovanni Battista de Negri (Condor), Hariclea Darclée (Odalea), Adeline Stehle (Adin), e Francesca Navarrini (Almazor). Apesar desse grupo estelar de cantores, a ópera não foi bem recebida.
O público de Milão já estava seduzido pela Nuova Scuola do estilo Verismo, com a estréia, um ano antes, de Cavalleria Rusticana, um estrondoso sucesso. Apesar de Gomes ter procurado inovar em sua partitura com vários elementos exóticos, ainda assim os críticos o consideraram muito tradicional. Houve apenas dez récitas, e em seguida o compositor apresentou a ópera no Rio de Janeiro, onde também não conseguiu as graças do público, devido ao fato de que o compositor era próximo do imperador recém-deposto, Pedro II.
Musicalmente a peça é elegante assim como as de Massenet, melodiosa como as de Gounod, e repleta de tessituras ousadas e temas orientais. Vários leitmotivs são empregados por Gomes, e há blocos contínuos de música, saindo da estrutura de números musicais isolados (por exemplo, Odalea só tem uma ária bem definida, em toda a ópera). Os saltos abruptos do registro médio para a alto enquadram-se já no estilo do Verismo. Há um bonito prelúdio com harpa; a orquestração é refinada; o coro participa muito, e o terceiro ato é magnífico, a começar pelo trecho instrumental mais conhecido, o "Notturno."
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A récita de Condor pelo Theatro São Pedro em 27 de março de 2016
No domingo de Páscoa, o teatro teve um bom público mas não estava completamente cheio. O espetáculo, parte da série Tardes de Ópera, foi apresentado semi-encenado, com alguns adereços e cubos espalhados pelo palco. Os cantores vestiram figurinos simples. Um pianista fez o acompanhamento musical, e não havia coro. Houve cortes especialmente no segundo ato, que ficou restrito à interação entre Condor e Zuleida (cerca de 20 minutos de cortes, resultando em um tempo total de uma hora e dez minutos, contando um intervalo de dez minutos).
Ainda assim, o admirável elenco foi extremamente convincente. A qualidade vocal desses jovens cantores é surpreendente. Todos se sairam muito bem, especialmente os dois protagonistas.
No papel título, o jovem Eduardo Trindade possui um instrumento de tenor com grande potência de volume, ótima projeção, boa musicalidade no manejo das frases, e um timbre muito bonito. Penso que ele tem muito futuro.
Marly Montoni foi excelente como Odalea. Uma verdadeira soprano spinto, ela desempenhou esse difícil papel vocal com grande competência principalmente no terceiro ato, após o aquecimento da voz. Outro ponto forte de Marly foi a representação. Seus gestos elegantes e grande forma física com seus braços torneados contribuiram para a certeza de que Marly tem o physique du rôle e grande presença de palco.
Os três artistas nos papéis complementares tiveram grande desempenho. Flávia Albano foi charmosa como Adin, e demonstrou agilidade de voz e facilidade nas notas agudas, com muita musicalidade no pianíssimo. A voz de Gustavo Lassen é muito bonita (um pouco de evolução na representação seria bem vinda, mas vocalmente ele desempenhou muito satisfatoriamente). Uma surpresa foi a ótima mezzo Andreia Souza, cujo domínio técnico em todas as regiões de amplitude de voz foi impressionante.
Em vários momentos era possível esquecer que a récita era semi-encenada, o que indica que a direção cênica de Paulo Esper foi impecável.
Frequentar a Tarde de Ópera no Theatro São Pedro foi muito agradável. Opera Lively foi recebida de forma muito simpática. Pudemos não apenas entrevistar o maestro Malheiro e o coordenador artístico Paulo Esper, como fomos convidados para assistir ao ensaio de Adriana Lecouvreur (com a grande Daniella Carvalho no papel título) e para conversar com os cantores e cantoras nos bastidores. A programação cultural do São Pedro é admirável, com nada menos do que 22 óperas na temporada 2016, sem contar concertos e recitais com fragmentos de óperas, e outras atividades (mais de 80 no total).
Vejam só: que outra compania brasileira apresenta, na mesma temporada, as óperas seguintes?
Dom Quixote
L'Amico Fritz
Condor
Adriana Lecouvreur
Roberto Devereux
La Bohème de Leoncavallo (não é a de Puccini)
A Hora Espanhola
Alyssa
Albert Herring
La Sonnambula
Iolanta
La Wally
O Espelho
O Anão
L'Enfant et les Sortilèges
El Huesped del Sevillano
La Gazza Ladra
Onde Vivem os Monstros
Monsieur Choufleuri
O Medium
Il Trovatore
Gianni Schicchi
Ficamos felizes com o dinamismo e vivacidade do teatro, e certos de que essas iniciativas darão fruto.
Seguem abaixo várias fotos do evento e do teatro, fotos dos intérpretes e suas biografias artísticas.
A compania de ópera do Theatro São Pedro, em São Paulo, SP, está extremamente ativa, com uma programação mais diversificada e numerosa do que qualquer outra compania brasileira. Opera Lively esteve presente na récita semi-encenada da última ópera de Carlos Gomes, Condor, no domingo de Páscoa, 27 de março de 2016. A apresentação contou com figurinos, maquiagem, aderêços, luzes teatrais, e um piano, mas sem orquestra, côro, e cenários.
9069
Poster original da estréia no La Scala
Condor, opera em três atos cantada em italiano, estréia em 21 de fevereiro de 1891 no Teatro alla Scala em Milão, Itália
Música de Carlos Gomes (1836-1896)
Libreto de Mario Canti
9070
Carlos Gomes
Pianista Paulo Almeida
Direção Cênica Paulo Esper *
Elenco:
Eduardo Trindade, tenor, no papel título de Condor *, um renegado, chefe da Horda Negra
Marly Montoni, soprano, Odalea *, rainha de Samarcanda (antiga cidade persa, hoje no Uzbequistão)
Flávia Albano, soprano, Adin (trouser role) *, um pagem da rainha
Gustavo Lassen, baixo, Almazor, um astrólogo da corte e homem sábio
Andreia Souza, mezzo-soprano, Zuleida, uma nômade, mãe de Condor
(o sexto personagem, Il Mufti, um curto papel comprimário, não foi incluído)
9071
O elenco - da esquerda para a direita, Andreia, Marly, Eduardo, Flávia, e Gustavo - Foto Opera Lively
* Entrevistados por Opera Lively - veja as entrevistas clicando nos links abaixo:
Marly [aqui (http://operalively.com/forums/content.php/1045-Entrevista-Exclusiva-de-Opera-Lively-com-a-soprano-brasileira-Marly-Montoni)]
Flávia [aqui (http://operalively.com/forums/content.php/1046-Entrevista-Exclusiva-de-Opera-Lively-com-a-soprano-brasileira-Flavia-Albano)]
Eduardo [aqui (http://operalively.com/forums/content.php/1048-Breve-Entrevista-Com-o-Tenor-Brasileiro-Eduardo-Trindade)]
Paulo [aqui] (o link será ativado no futuro próximo - entrevista ainda não publicada)
Não percam também a entrevista com o maestro Luiz Fernando Malheiro, diretor artístico e principal regente do Theatro São Pedro e do Festival de Ópera do Amazonas, também já gravada mas ainda não transcrita e publicada.
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A Ópera
Ato I - Por razões de preceitos religiosos, não se permite que Odalea, rainha da Samarcanda, conheça o amor por um homem. Após um prelúdio, Adin, um pagem da soberana, anuncia que alguém - o renegado Condor, chefe da Horda Negra de bandoleiros - violou a área sagrada do castelo real, ao tentar invadir esses aposentos para ver a beleza da rainha. Condor prontamente declara seu amor por Odalea, que se vê incapacitada de ordenar que o matem, para grande indignação da corte e de Almazor (um astrólogo e homem sábio).
Ato II - A rainha vai à mesquita para participar de ritos religiosos, mas sua comitiva é atacada por selvagens. Condor, recusando-se a ouvir os conselhos de sua mãe Zuleida (que está preocupada com sua obsessão por Odalea), salva a rainha do ataque. Odalea deseja encontrar seu salvador, e Zuleida lhe diz que Condor é o filho do sultão Amurath, portanto tem sangue nobre. A rainha, cada vez mais apaixonada por Condor, o nomeia como Emir. O povo, no entanto, não aceita a nomeação e se revolta.
Ato III - Após a bela peça instrumental "Notturno", Odalea está agitada e indecisa entre o dever e o amor. Almazor anuncia que a vida da rainha está ameaçada por causa de seu amor. Adin canta do amor de uma pomba por um gavião. Condor se oferece para sacrificar a própria vida para salvar Odalea. Um grande incêndio atinge a cidade. Condor se suicida com um punhal, para salvar a rainha. O povo invade o palácio e vê Odalea se debruçando sobre o cadáver se seu amado. Odalea joga o punhal ao chão, e grita "Agora, povo ingrato, rasguem meu coração também."
Números musicais e duração
Preludio - 5:08
Ato I – 25:51
Nel regno delle rose (Adin)
Dell'arme il segnal (Almazor, Odalea, Adin)
Aquila pellegrina che fendi... (voce lontana - Condor)
Dea celeste ideal (Odalea sola - indi Condor)
Ato II – 22:15
Già l'alba appar, fedeli, alla preghiera (popolo)
Orda crudel, feroce (monologo - Zuleida)
Orda selvaggia (popolo, il Mufti, Adin)
Vedi, commossa ell'è (assieme - indi Zuleida, Condor)
Ato III – 31:02
Notturno
Quanto silenzio a me... (Odalea sola - frase)
Avea sultana altera (serenata - Adin)
Ti vedo, ognor, in tua follia sublime (Odalea)
Le mie stele salutano in te (Adin, Zuleida, Condor, Almazor)
Fissami in volto, dimmi (Odalea, Condor)
Total – 84:16
Discografia
Há uma gravação da ópera feita ao vivo em 1986 no Theatro Municipal de São Paulo. O regente é o maestro Armando Belarditro, com a orquestra do teatro. Intérpretes: Renata Lucci (Odalea), Sérgio Albertini (Condor), Niza de Castro Tank (Adin), Tereza Boschetti (Zuleida), Benedito Silva (Almazor), e Jairo Vaz (il Mufti).
9076
Apesar dos vários ruídos e do som ruim, os cantores e a orquestra são bons, e recomendo essa gravação aos leitores que querem se familiarizar com a ópera. Os números musicais dessa gravação podem ser encontrados no YouTube, completos, em sequência autoplay. Eis aquí o primeiro número:
https://www.youtube.com/watch?v=9y9EMr8tWXE
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Histórico da ópera e comentário musical
Condor foi a última ópera de Carlos Gomes e a penúltima obra de expressão do compositor, antes do poema vocal-sinfônico Colombo. Foi encomendada pelo Teatro alla Scala (a única vez que isso aconteceu na carreira de Gomes). Ele estava no Brasil para a apresentação de Lo Schiavo no Rio, já sofrendo os primeiros sintomas da doença que haveria de matá-lo, quando recebeu o convite do Scala. O teatro deu-lhe o libreto já pronto, sem que o compositor pudesse influenciar a escolha. O libretista Mario Canti é bastante obscuro.
A ópera é ambientada na antiga cidade de Samarcanda, conhecida como a Roma do Leste ou Pérola do Oriente, povoada por persas, e hoje localizada no Uzbequistão. O compositor estava no auge de sua maturidade musical, e o terceiro ato é um dos mais belos de sua carreira.
A ópera Condor é também conhecida como Odalea. Aparentemente Carlos Gomes trocou o nome porque pensava em levar a ópera à França, e na linguagem da época "con d'or" (cone de ouro) era a gíria que se referia à genitália feminina.
Após cinco meses compondo a peça, a estréia se deu no dia 21 de fevereiro de 1891, com um elenco de primeira: Giovanni Battista de Negri (Condor), Hariclea Darclée (Odalea), Adeline Stehle (Adin), e Francesca Navarrini (Almazor). Apesar desse grupo estelar de cantores, a ópera não foi bem recebida.
O público de Milão já estava seduzido pela Nuova Scuola do estilo Verismo, com a estréia, um ano antes, de Cavalleria Rusticana, um estrondoso sucesso. Apesar de Gomes ter procurado inovar em sua partitura com vários elementos exóticos, ainda assim os críticos o consideraram muito tradicional. Houve apenas dez récitas, e em seguida o compositor apresentou a ópera no Rio de Janeiro, onde também não conseguiu as graças do público, devido ao fato de que o compositor era próximo do imperador recém-deposto, Pedro II.
Musicalmente a peça é elegante assim como as de Massenet, melodiosa como as de Gounod, e repleta de tessituras ousadas e temas orientais. Vários leitmotivs são empregados por Gomes, e há blocos contínuos de música, saindo da estrutura de números musicais isolados (por exemplo, Odalea só tem uma ária bem definida, em toda a ópera). Os saltos abruptos do registro médio para a alto enquadram-se já no estilo do Verismo. Há um bonito prelúdio com harpa; a orquestração é refinada; o coro participa muito, e o terceiro ato é magnífico, a começar pelo trecho instrumental mais conhecido, o "Notturno."
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A récita de Condor pelo Theatro São Pedro em 27 de março de 2016
No domingo de Páscoa, o teatro teve um bom público mas não estava completamente cheio. O espetáculo, parte da série Tardes de Ópera, foi apresentado semi-encenado, com alguns adereços e cubos espalhados pelo palco. Os cantores vestiram figurinos simples. Um pianista fez o acompanhamento musical, e não havia coro. Houve cortes especialmente no segundo ato, que ficou restrito à interação entre Condor e Zuleida (cerca de 20 minutos de cortes, resultando em um tempo total de uma hora e dez minutos, contando um intervalo de dez minutos).
Ainda assim, o admirável elenco foi extremamente convincente. A qualidade vocal desses jovens cantores é surpreendente. Todos se sairam muito bem, especialmente os dois protagonistas.
No papel título, o jovem Eduardo Trindade possui um instrumento de tenor com grande potência de volume, ótima projeção, boa musicalidade no manejo das frases, e um timbre muito bonito. Penso que ele tem muito futuro.
Marly Montoni foi excelente como Odalea. Uma verdadeira soprano spinto, ela desempenhou esse difícil papel vocal com grande competência principalmente no terceiro ato, após o aquecimento da voz. Outro ponto forte de Marly foi a representação. Seus gestos elegantes e grande forma física com seus braços torneados contribuiram para a certeza de que Marly tem o physique du rôle e grande presença de palco.
Os três artistas nos papéis complementares tiveram grande desempenho. Flávia Albano foi charmosa como Adin, e demonstrou agilidade de voz e facilidade nas notas agudas, com muita musicalidade no pianíssimo. A voz de Gustavo Lassen é muito bonita (um pouco de evolução na representação seria bem vinda, mas vocalmente ele desempenhou muito satisfatoriamente). Uma surpresa foi a ótima mezzo Andreia Souza, cujo domínio técnico em todas as regiões de amplitude de voz foi impressionante.
Em vários momentos era possível esquecer que a récita era semi-encenada, o que indica que a direção cênica de Paulo Esper foi impecável.
Frequentar a Tarde de Ópera no Theatro São Pedro foi muito agradável. Opera Lively foi recebida de forma muito simpática. Pudemos não apenas entrevistar o maestro Malheiro e o coordenador artístico Paulo Esper, como fomos convidados para assistir ao ensaio de Adriana Lecouvreur (com a grande Daniella Carvalho no papel título) e para conversar com os cantores e cantoras nos bastidores. A programação cultural do São Pedro é admirável, com nada menos do que 22 óperas na temporada 2016, sem contar concertos e recitais com fragmentos de óperas, e outras atividades (mais de 80 no total).
Vejam só: que outra compania brasileira apresenta, na mesma temporada, as óperas seguintes?
Dom Quixote
L'Amico Fritz
Condor
Adriana Lecouvreur
Roberto Devereux
La Bohème de Leoncavallo (não é a de Puccini)
A Hora Espanhola
Alyssa
Albert Herring
La Sonnambula
Iolanta
La Wally
O Espelho
O Anão
L'Enfant et les Sortilèges
El Huesped del Sevillano
La Gazza Ladra
Onde Vivem os Monstros
Monsieur Choufleuri
O Medium
Il Trovatore
Gianni Schicchi
Ficamos felizes com o dinamismo e vivacidade do teatro, e certos de que essas iniciativas darão fruto.
Seguem abaixo várias fotos do evento e do teatro, fotos dos intérpretes e suas biografias artísticas.